Política
A realidade desmonta argumento para anular o acordo da Odebrecht
É formidável. Para anular o acordo de leniência da Odebrecht com a Lava Jato, o ministro Dias Toffoli usou como um dos argumento objetivos, naquele mar de subjetividades, a história de que os procuradores da operação não haviam feito pedido oficial de cooperação internacional, via Ministério da Justiça, para ter acesso aos dados do sistema eletrônico que geria o departamento de propinas da empreiteira. Esses dados, que serviram como provas no acordo de leniência da Odebrecht, estavam armazenados na Suíça e foram enviados à Procuradoria-Geral da República (PGR) em outubro de 2017.
Só que os procuradores da Lava Jato usaram a via oficial, sim. Depois de dizer a Dias Toffoli, no final de agosto, que não havia achado qualquer pedido de cooperação internacional da Lava Jato nos seus sistemas, o Ministério da Justiça mandou um ofício ao ministro do STF, nessa terça feira, informando que encontrou a solicitação formal da PGR à Suíça, feita em 2016 por meio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), vinculado à pasta, meses antes de o acordo de leniência ser assinado. Um ano mais tarde, as autoridades suíças enviaram o material ao ministério, que o repassou aos procuradores.
O pedido que não existia até a anulação do acordo de leniência da Odebrecht passou a existir depois da anulação do acordo de leniência da Odebrecht. O Ministério da Justiça diz ter realizado uma busca mais “detalhada”. Certamente, é apenas uma coincidência que seja Lula, atual presidente da República, o impetrante da reclamação para anular as provas do pagamento de propinas pela Odebrecht, fruto do acordo.
O Ministério da Justiça deu ambas as respostas sobre o pedido de cooperação internacional — a errada e a certa — no âmbito de uma ação do doleiro Rodrigo Tacla Duran, que lavava dinheiro para a empreiteira e que se diz perseguido injustamente pela Lava Jato, pobrezinho. Assim como Lula, ele diz que o acordo de leniência está eivado de ilegalidades. À diferença de Lula, ele não poderá mais dizer que a Lava Jato ignorou as regras para obter os dados que estavam na Suíça.
Dias Toffoli voltará atrás na anulação? A questão é que, na verdade, o pedido oficial de cooperação internacional já estava em poder do STF fazia tempo, justamente no âmbito da reclamação de Lula, e ela foi ignorada. Em 14 de dezembro de 2020, a Corregedoria da Procuradoria-Geral da República encaminhou ao ministro Ricardo Lewandowski, de quem Dias Toffoli herdou a reclamação de Lula contra o acordo de leniência da Odebrecht, todos os documentos sobre a cooperação internacional, incluindo a solicitação da PGR feita à Suíça, via Ministério da Justiça, segundo informa o repórter Luiz Vassallo, da sucursal paulista do Metrópoles.
A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) recorreu da anulação do acordo. Alegou que tudo sempre esteve dentro dos conformes, O trabalho dos procuradores da Lava Jato, diz a ANPR, seguiu “rigorosamente os tratados internacionais multilaterais e bilaterais e a legislação brasileira”.
Na decisão em que afirma que não houve pedido oficial de cooperação, Dias Toffoli escreveu: “Deve-se, urgentemente, apurar a conduta dos agentes públicos envolvidos nesta operação, que ocorreu sem a necessária concorrência do Ministério da Justiça e Segurança Pública (na condição de Autoridade Central brasileira) e da Advocacia Geral da União (na condição de representante da União)”. Se há uma conduta de agente público a ser apurada, não é a dos procuradores da Lava Jato. Se há algo a ser anulado, é a anulação do acordo de leniência da Odebrecht.
Metrópoles
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